Clipping – Suno – Fundos Imobiliários e setor imobiliário: rumo à convergência

Nos últimos dois anos, período em que praticamente se sobrepõe ao início da pandemia, a inflação da construção civil medida pela variação do INCC foi da ordem de 24%, cerca de 11,4% a.a. Já o incremento do custo dos terrenos na cidade de São Paulo, com base nos investimentos que fizemos nesse período, foi até um pouco superior a esse percentual, embora bastante próximo.

Ou seja, no período considerado, os dois grandes insumos para desenvolvimento de projetos imobiliários, de forma mais genérica, tiveram uma variação de preço médio pelo menos da ordem de 24%. Isso significa que, para desenvolver um projeto imobiliário hoje, o custo é facilmente 24% superior ao que era há 2 anos atrás. Assim, um incorporador, para tentar manter sua margem de lucro no desenvolvimento de um projeto, deveria aumentar seu preço de venda pelo menos em 24%.

Quando analisamos os preços dos imóveis na economia real conseguimos perceber que, de fato, os preços finais aumentaram nesse intervalo. Em alguns projetos de alto padrão, temos aumentos seguramente até superiores a esse patamar. Para outros projetos os aumentos também foram bastante expressivos, embora, provavelmente, não suficientes para deixar intocada a margem dos desenvolvedores, mas o suficiente para ainda manter a sua viabilidade econômica.

Nesse mesmo período, enquanto o custo e o preço dos imóveis aumentavam expressivamente, o IFIX reduzia seu patamar de cerca de 3.000 pontos para cerca de 2.800 pontos – queda, portanto de 6,7%. E desde julho de 2020 (logo, há mais de um ano e meio), o IFIX tem se mantido no patamar atual, no intervalo de 2.700 a 2.800 pontos, claro que com volatilidade em torno desse range.

Ou seja, enquanto os insumos básicos para desenvolvimento de projetos imobiliários aumentaram cerca de 24%, o IFIX não só não acompanhou essa variação, mas teve queda de mais de 6%. Arredondando, a grosso modo, pode-se dizer que o descasamento desses índices nos dois últimos anos foi da ordem de 30%. Se tivéssemos tido um aumento de renda equivalente esse problema não existiria, mas isso não aconteceu…

É claro que nesse período os juros aumentaram significativamente – NTN-B de duration longa (2030), por exemplo, passando de IPCA + 3,0% para IPCA + 5,5% – e com isso os investimentos em Fundos Imobiliários foram afetados na medida em que os investidores passaram a exigir um prêmio de risco maior do produto. Esse maior prêmio atualmente está em cerca de 450bps para FIIs de ativos financeiros e 350bps para FIIs de tijolo.

Mas não foi apenas o aumento do prêmio pelo risco que impactou a precificação dos FIIs. Vivemos um período em que tanto o custo de reposição dos ativos quanto o preço dos imóveis aumentaram, mas, na pratica as receitas por eles geradas não acompanharam esse aumento no curto prazo, em muitos casos em função do aumento da vacância dos ativos decorrente dos efeitos da pandemia.

Pode-se ver isso facilmente, por exemplo, nos setores de prédios corporativos, no mercado de shopping center e no mercado de renda residencial. No setor de logística, temos uma situação um pouco diferente porque tivemos um forte aumento da demanda que refletiu também num discreto aumento das receitas de aluguéis. Já no setor de imóveis residenciais para venda também foi perceptível o aumento das receitas de vendas, mas ainda menor que o aumento de custos.

Quando avaliamos as novas ofertas públicas (ICVM 400) de Fundos Imobiliários para Fundos de Tijolo nos últimos 12 meses, percebemos que elas reduziram significativamente, passando de R$ 11 bilhões em 2020 para R$ 5 bilhões em 2021. Isso demonstra não necessariamente que o investidor está reticente a esse mercado, mas sobretudo que os níveis de retorno exigidos pelos investidores de uma forma geral estão menos compatíveis com a estrutura de custos para desenvolvimento de projetos.

Enquanto o mercado imobiliário mais “puro” trabalha com horizontes de longo prazo e considera muito a apreciação dos ativos via ganho de capital, os Fundos Imobiliários em geral têm sua precificação baseada na geração de dividendos de curto prazo (yield) e não nas expectativas de longo prazo dos ativos. Enquanto os ativos imobiliários ainda são vistos como reserva de valor, as quotas de FII são vistas mais como um ativo gerador de um fluxo periódico e previsível de dividendos, quando na verdade também podem ser um interessantíssimo instrumento para aferição de ganhos de capital.

A rentabilidade hoje exigida pelos investidores dificulta a aquisição de novos projetos em que a conta feche para o vendedor e para o comprador. Para rentabilizar o ativo da forma que o investidor espera, o vendedor do projeto teria que vendê-lo por um valor inferior ao por ele esperado. Isso faz com que os negócios não aconteçam e desacelera o mercado.

Developers querem vender ativos por preços maiores por causa do aumento de custos, ao passo que gestores precisam comprar os ativos por preços menores para entregar a rentabilidade esperada pelo investidor por conta do aumento de juros e do prêmio pelo risco.

A defasagem de preços existente entre transações realizadas com quotas de Fundos Imobiliários vis-à-vis transações de ativos imobiliários diretamente é bastante grande, ao contrário do que seria intuitivo, dado que os FII trazem comparativamente inúmeros benefícios adicionais a seus investidores, sendo o principal a liquidez.

Na nossa visão, assim que o mercado tiver alguma clareza quanto ao horizonte de redução das taxas de juros pelo Banco Central (o que tende a acontecer em breve), quanto ao início da recuperação da economia e consequente melhoria da ocupação dos ativos imobiliários e geração de renda, a tendência é de que haja uma recuperação muito rápida do valor da quota dos Fundos Imobiliários, com natural recuperação do IFIX. Nesse momento o mercado ajustará o descompasso citado de 30% entre o IFIX e a estrutura de custos atual da construção civil e voltarão com força as novas emissões de quotas de FII.

Dada essa expectativa e o poder que o instrumento Fundo Imobiliário alcançou até hoje no mercado brasileiro, quem já está exposto ao setor é saudável manter sua posição. Quem ainda não está é recomendável tomar uma posição (fazendo obviamente a necessária análise dos Fundos, suas políticas de investimento, gestores, riscos e ativos), sobretudo em um momento em que as oportunidades existentes no mercado secundário são tão claras e abundantes.

Fonte: Suno