Clipping – Jornal do Comércio – Devido à pandemia de coronavírus, locatários com aluguel atrasado estão protegidos até outubro

Por conta da pandemia do novo coronavírus, centenas de brasileiros ficaram desempregados e sem fonte de renda e muitos não são proprietários do imóvel em que residem. Segundo um levantamento de 2019 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, o Brasil conta com mais de 13,3 milhões de imóveis alugados. Desde o início da pandemia, o Direito Imobiliário tenta encontrar soluções para evitar impactos negativos. Em entrevista ao Jornal da Lei, o advogado especialista em Direito Civil, com experiência na área de negociações imobiliárias, Fernando Corsetti Manozzo explica o atual contexto.

Jornal da Lei – Após quase seis meses do início da pandemia, aconteceu alguma alteração significativa para locatários e locadores?
Fernando Corsetti Manozzo – Comparado aos primeiros dias e semanas, o que se percebe, transcorrido quase meio ano, é a consolidação do entendimento inicial de que, salvo situações específicas, a alternativa negocial, normalmente pela redução, ainda que apenas temporária, dos locativos, é preferível à disputa judicial. Isso porque a disputa judicial envolve custos e incertezas. Em muitos dos casos, essa incerteza se torna um passivo para a parte que perde. Ao passo que, em uma negociação, por mais dura que seja, os critérios são aqueles estabelecidos. Lembrando que, em alguns casos, a disputa judicial é a única opção. Quando o impeditivo do processo é de ordem técnica, nesse caso a negociação se impõe naturalmente. O que coloco como condição particular, que leva a uma disputa judicial, é uma eventual não concessão ou falta de interesse da outra parte em fazer algum tipo de acordo.
JL – A negociação tem sido bastante utilizada durante esses tempos de pandemia?
Manozzo – Sim. É claro que alguns casos acabam tendo que ser judicializados por suas particularidades. Mas a regra tem sido a negociação. O que se tem feito muito é o aditamento de contratos de locação para estabelecer as novas regras aplicáveis. O aditamento é exatamente para que sejam documentadas essas novas regras, que podem ser para um período de todo o contrato ou de três meses, por exemplo. Serve para documentar o que a negociação determinar.
JL – De que forma a legislação precisou se flexibilizar ou criar novas recomendações para conseguir se adaptar às novas realidades trazidas pela pandemia?
Manozzo – A notória flexibilização foi a proibição, até 30 de outubro, da realização de despejos nos casos em que seria possível decorrente da inadimplência no pagamento dos locativos. No ambiente legislativo geral aplicável ao Direito Imobiliário, há também outras medidas para a adaptação à nova realidade, a exemplo da suspensão, até a mesma data, dos prazos de aquisição de propriedade por usucapião.
JL – Quais são os riscos que locatários correm atualmente caso atrasem prestações?
Manozzo – O risco maior é mesmo o despejo, que, conforme legislação, em certos casos pode ser autorizado liminarmente, sem prejuízo da vedação temporária, até 30 de outubro. Um dos casos clássicos de despejo é quando o locatário atrasa o pagamento do aluguel, entrando em situação de inadimplência, e o contrato não prevê garantias do pagamento como, por exemplo, fiador ou caução. Para esses casos, tem a vedação. Significa que, mesmo que o devedor esteja inadimplente, o locador não vai poder promover o despejo dele até aquela data. É um benefício de natureza social, para assegurar aquelas partes que perderam renda devido à pandemia. Ou seja, se ficarem inadimplentes, não terão sua moradia de aluguel retirada, mesmo que os contratos não tenham garantia até 30 de outubro. Nos casos de financiamentos habitacionais, o que se viu foi a adoção do congelamento dos pagamentos. A Caixa Econômica Federal, maior ator desse setor, possibilitou, por até 180 dias, suspender pagamentos, reduzir parcelas ou outorgar carência, sem que juros, seguros e taxas sejam carregados à conta do saldo devedor.
JL – Como o senhor interpreta a determinação desses prazos?
Manozzo – Esses prazos são em favor do locatário, que poderá ficar inadimplente. É, portanto, um prejuízo para o locador, porque o cidadão pode parar de pagar e não será despejado no período. A questão do aluguel, especialmente o residencial, permite moradia para muitas famílias, e hoje há essa proteção. O problema é que o dia 30 de outubro vai chegar. E se essas pessoas não conseguirem retomar seus empregos? E se retomarem um emprego que não garante renda suficiente para continuar arcando com o aluguel? O período que passou, já passou. A situação está mantida. Mas e depois? O ideal seria uma legislação que estabelecesse uma linha média de proteção aos locatários e aos locadores, uma vez que muitos dependem do valor do aluguel para manter a renda. A lei optou por proteger o locatário, mas a situação pode ser estendida e temos que achar uma alternativa equilibrada para não ser injusto.

 

Fonte: Jornal do Comércio

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